“DE PERTO NINGUÉM É NORMAL”

 

Quando o Caetano Veloso, algum tempo atrás, afirmou que “de perto ninguém é normal”, ele estava absolutamente certo e essa fala, muito mais do que emitir uma opinião ou um juízo de valor, representa uma verdade científica: a normalidade absoluta não existe. Todos nós, em graus pessoais e variados, apresentamos distorções do senso de realidade e respostas inadequadas diante das urgências e das circunstâncias da vida. Somos todos vulneráveis aos fatores ambientais estressantes e nem sempre conseguimos lidar de uma forma adequada e saudável com o que acontece com a gente.

Os valores de cada época determinam o que é normal e o que não é, quem é normal e quem não é. Assim, o conceito de normalidade está ligado a tudo o que é senso comum; ao que representa uma adequação de palavras, atos e aparência; ao que é socialmente esperado e prudente; a uma aceitação irrestrita das normas e valores sociais e tudo o que ultrapassa o convencional e foge às regras sociais é considerado loucura, desatino e devaneio. Dessa forma, um juízo de valor vira termômetro de realidade.

COMPREENSÃO DA REALIDADE

As condições objetivas do viver são pessoais e diferenciadas, mas nos unificamos no desejo de sermos reconhecidos e amados. Queremos ser únicos e, ao mesmo tempo, nos reconhecer e sermos reconhecidos em um grupo de iguais. A necessidade de pertencer, de ser aceito e acolhido por outras pessoas é vital e interfere no nosso desenvolvimento biopsicossocial. Por tudo isso, devíamos ser mais receptivos ao diferente. As pessoas não são uma produção em série, cada um de nós é um ser único e diferenciado e, por isso, percebe o mundo de uma forma específica.

É claro que existe um protocolo de pensamentos, gestos e condutas que determinam um padrão de aceitação social e isso é necessário para se viver em comunidade, mas, ao mesmo tempo em que é necessário respeitar as diferenças, é preciso saber perceber quando essas diferenças se dão por problemas mais sérios e apresentam distorções do pensamento e da percepção da realidade, produzem afetos inadequados, provocam sofrimento, interferem nas funções pessoais e comprometem a vida das pessoas, as impedindo de produzir felicidade e viver seus afetos de uma forma saudável.

HARMONIA ENTRE PENSAMENTO E REALIDADE

Nós vivemos em uma sociedade cada vez mais complexa e exigente, o que contribui para o enlouquecimento humano. Compreender as nossas emoções e a dos outros é indispensável para que se perceba e aceite diferenças e se entenda as vulnerabilidades. Quando uma pessoa apresenta distorções prolongadas do seu senso de realidade e inadequação com relação à vida a sua volta, modificando o seu jeito habitual de pensar, sentir e agir, ou seja, quando ela apresenta algum tipo de transtorno ou doença emocional é quando ela mais precisa ser aceita e acolhida.

A história das doenças mentais mostra que a loucura está presente em todas as épocas, com características diferenciadas e se faz presente em cada um de nós, em menor ou maior grau e talvez por perceberem isso é que muitas pessoas questionam a sua própria sanidade e também a dos outros. De qualquer forma, independente do grau do comprometimento mental, do tamanho das impossibilidades emocionais e das dificuldades apresentadas por qualquer pessoa, seja momentânea ou permanente, isso representa algo que não aconteceu com ela por escolha pessoal e sim por contingências da vida. Essas pessoas precisam ser acolhidas, amparadas e não discriminadas. De um modo geral, as pessoas costumam ter medo da loucura dos outros, mas loucos somos todos nós.

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